O diabetes mellitus tipo 1 (DM1) é uma das doenças crônicas mais prevalentes da infância e adolescência. Seu tratamento é complexo e multifatorial, demandando abordagens personalizadas. Apesar dos avanços farmacológicos e tecnológicos das últimas décadas, a aquisição e manutenção do controle glicêmico desejável e os desfechos terapêuticos recomendados ainda são um grande desafio.
O diagnóstico precoce e intervenções terapêuticas adaptadas às necessidades individuais, busca não apenas fornecer uma visão aprofundada dos avanços clínicos, mas também promover uma abordagem humanizada na gestão dessa condição crônica.
Panorama
O DM1 é uma doença autoimune causado pela autodestruição gradual das células beta pancreáticas, produtoras de insulina, que resulta frequentemente na sua perda total e dependência completa da insulina exógena. O DM1 corresponde a 90% dos casos de diabetes diagnosticados em pacientes menores de 15 anos, constituindo-se uma das principais doenças crônicas pediátricas.
A criança já nasce com predisposição genética para o desenvolvimento do DM1. Durante algum momento de sua vida, um desencadeante ambiental atua como gatilho, ativando a autoimunidade celular. A partir disso, o paciente evolui sequencialmente pelas fases de intolerância à glicose, pré-diabetes e diabetes clinicamente estabelecido.
Alguns dos fatores ambientais associados ao desencadeamento do diabetes são: infecções virais (caxumba, citomegalovírus, rubéola, influenza, H1N1, enterovírus, rotavírus e, mais recentemente o SARS-CoV-2), antecipação do desmame com introdução precoce de leite de vaca e cereais, deficiência de vitamina D, exposição a medicamentos ou toxinas (aloxano, estreptozotocina, toxinas e metais pesados), estresse físico, psíquico ou emocional, idade materna acima de 35 anos, parto cesáreo e ganho ponderal materno excessivo durante a gestação. É importante salientar junto aos pacientes que vacinação não é um fator desencadeante.
Sinais e sintomas
As quatro manifestações clássicas que levam ao diagnóstico de DM1 são: poliúria, polidipsia, polifagia e perda de peso, conhecidas como “polis”. Outras queixas frequentemente relatadas são: taquipneia, visão turva, cansaço, broncoespasmo, hálito cetônico, presença de formigas na urina presente em superfícies e candidíase genital.
O não reconhecimento dessas queixas como manifestação de DM1, faz com que aproximadamente 30% a 50% dos pacientes sejam diagnosticados tardiamente já com cetoacidose diabética.
E quando pensar em DM1 no atendimento de emergência? Pacientes com cetoacidose diabética, desidratados e com vômitos, podem ter o diagnóstico confundido com gastrenterite. A diferença é que na gastrenterite ocorre desidratação e oligúria, enquanto no DM1, ocorre desidratação com poliúria. Outra possível confusão diagnóstica é com o abdome agudo. Pacientes com cetoacidose diabética podem cursar com dor abdominal e serem confundidos como tendo apendicite ou abdome agudo cirúrgico, quando na realidade, a dor abdominal é decorrente da isquemia mesentérica. O grande diagnóstico diferencial é o fato de que na cetoacidose, a dor abdominal pode melhorar com a hidratação.
Promoção do autocuidado
A insulinoterapia exógena continua sendo a única forma de reposição insulínica em crianças e adolescentes com DM1. Entretanto, o enfoque personalizado juntamente com intervenções terapêuticas adaptadas às necessidades individuais, promove não apenas avanços clínicos, mas também uma abordagem humanizada na gestão dessa condição crônica em pacientes pediátricos.
A educação continuada para o autocuidado é o meio de promover a integração à vida diária dos esquemas diversificados de administração de insulina, das técnicas de abordagem nutricional, da atividade física regular, do monitoramento glicêmico intensivo visando capacitar o paciente e seus cuidadores a manter o controle glicêmico o mais normal possível a maior parte do tempo.
Educação em diabetes é o processo de promoção de conhecimento sobre a doença, de facilitação da aprendizagem das técnicas e habilidades necessárias para o autocuidado, do manejo das crises de descompensação agudas e da mudança de comportamento que conduza ao bom controle metabólico no longo prazo.
A educação para o autocuidado compreende as seguintes atuações:
- capacitar o paciente para a solução de problemas;
- ajudá-lo a identificar barreiras e a desenvolver habilidades de enfrentamento dessas questões;
- promover a colaboração ativa com a equipe multiprofissional;
- fornecer orientação para o processo contínuo de decisão terapêutica.
Texto aprovado pelo médico pediatra Rodrigo Silveira, endocrinologista do Hospital Pequeno Príncipe.
Referências bibliográficas:
Diabetes melito tipo 1 na criança e no adolescente: Orientações para o pediatra – Sociedade Brasileira de Pediatria – Departamento Científico de Endocrinologia (gestão 2022-2024) – Nº 37, 20 de janeiro de 2023.
Diabetes mellitus tipo 1 e Autocuidado – Sociedade Brasileira de Pediatria – Departamento Científico de Endocrinologia – Nº 3, setembro de 2018.