A doença celíaca é um distúrbio sistêmico, de caráter autoimune, desencadeada pela exposição alimentar ao glúten, que surge em indivíduos geneticamente suscetíveis de todas as idades. Na pediatria, ocorre mais comumente na infância precoce, meses após a introdução do glúten na dieta.
Características da doença celíaca
A doença celíaca é uma enteropatia crônica e permanente desencadeada pelo glúten, caracterizada histologicamente por atrofia subtotal ou total da mucosa do intestino delgado, causando a síndrome de má-absorção. No indivíduo geneticamente predisposto, o glúten ingerido desencadeia uma reação imunológica, mediada por linfócitos, responsável pela agressão à mucosa intestinal.
O desenvolvimento da doença celíaca depende de uma interação de fatores genéticos, imunológicos e ambientais. O paciente com doença celíaca apresenta uma atrofia da mucosa intestinal, que leva a um prejuízo na absorção de macro e micronutrientes. A atrofia ocorre devido a um processo inflamatório local, decorrente de uma resposta imunológica exacerbada, ativada de forma errônea, contra componentes da mucosa intestinal do próprio indivíduo. Esta atividade autoimune só ocorre em indivíduos geneticamente predispostos, que pode ser ativada em qualquer momento ao longo da vida e depende do contato com o glúten, uma proteína alimentar presente nos cereais, trigo, centeio, cevada e aveia.
Importante ressaltar que as manifestações não são imediatas à ingestão de alimentos com glúten. Quando ocorre reação imediata (manifestações na pele, sintomas respiratórios ou gastrointestinais), deve ser considerada a hipótese de alergia alimentar ao trigo e não de doença celíaca.
Manifestações clínicas
A doença celíaca possui amplo espectro de manifestações clínicas e a idade preferencial de seu início é a infância. A forma clássica surge habitualmente até aos dois anos de idade e predominam sintomas gastrointestinais:
- diarreia,
- perda de peso,
- distensão abdominal,
- vômito ou constipação,
- irritabilidade ou prostração.
A doença celíaca atípica é aquela em que os sintomas gastrointestinais são mínimos ou ausentes e predominam os sintomas sistêmicos e inespecíficos. Surge habitualmente em crianças mais velhas e adultos. Alguns dos sintomas atípicos são:
- atraso de crescimento,
- atraso pubertário,
- dor abdominal,
- obstipação,
- artralgias,
- alterações do ciclo menstrual,
Como diagnosticar
O diagnóstico é baseado na combinação de achados clínicos, sorológicos e histológicos. O teste sorológico indicado de rotina para o rastreio da doença é o anticorpo anti-transglutaminase, antiendomisio ou anti gliadina deaminada. Quanto maior o nível sérico do anticorpo, maior a chance do indivíduo ser de fato celíaco, e vice e versa. Lembrar que a presença do anticorpo não define se o indivíduo é doente.
Da parte histológica, deve-se observar na biópsia as características da mucosa, como: achatamento da mucosa, o endenteamento das pregas, vasos sanguíneos da submucosa visíveis e o padrão mosaico da mucosa entre as pregas. Na atrofia parcial pode-se observar achatamento leve ou uma mucosa aparentemente normal. As vantagens da biópsia via endoscópica são a visualização de toda a mucosa e a realização de múltiplas biópsias. Geralmente são feitas duas biópsias na 1ª, 2ª, 3ª e 4ª porções do duodeno.
Vivendo com a doença celíaca
O tratamento consiste na retirada permanente do glúten da dieta, pois ajuda na regeneração das lesões da mucosa intestinal assegurando o adequado desenvolvimento e crescimento das crianças e adolescentes, prevenindo as complicações da doença na idade adulta. Dietas sem glúten têm sido associadas ao aumento de energia e melhora de concentração. Ainda assim, esta dieta só deve ser iniciada após a confirmação do diagnóstico.
Para a substituição do trigo, centeio e cevada, costumam-se usar produtos à base de arroz, milho, sorgo (milho-zaburro), amêndoas, plantas leguminosas, soja, trigo-sarraceno, chia, grão de bico, quinoa e mandioca. A aveia, se não contaminada por outros grãos que contém glúten, também pode ser consumida.
Fontes naturalmente isentas de glúten:
- Cereais e tubérculos: arroz, milho, mandioca, tapioca, polvilho, alfarroba, fécula de batatas;
- Carne, pescado e ovos – frescos ou congelados;
- Leite, iogurtes naturais, queijos frescos e processados de composição permitida, requeijão;
- Fruta e vegetais incluindo a batata e leguminosas (feijão, grão, ervilhas, lentilhas, soja); e
- Azeite, óleos vegetais, manteiga.
Complicações
Os pacientes devem ser acompanhados periodicamente para avaliação da aderência à dieta sem glúten e rastreio de possíveis complicações. Em crianças, deve-se dar especial atenção ao acompanhamento do crescimento e desenvolvimento. Além disso, outras complicações observadas são: infertilidade, osteoporose, osteomalácia, raquitismo, distúrbios neurológicos, psiquiátricos, outras doenças autoimunes, linfoma e câncer.
Aula gravada :: Doença Celíaca
A doença celíaca é um distúrbio autoimune, sem cura, causada pela intolerância ao glúten, uma proteína encontrada no trigo, aveia, cevada, centeio, e seus derivados. Isso acontece porque o corpo não produz, ou produz pouca enzima capaz de degradar o glúten, provocando uma reação do sistema imune que pode de levar a lesões no intestino. Com isso, o órgão perde a capacidade de absorver os nutrientes dos alimentos, levando o portador a desenvolver diversas doenças e condições decorrentes da má absorção, desde desnutrição, déficit de peso e crescimento até anemia e osteoporose.
O curso gratuito Doença Celíaca: Cuidados, Diagnóstico Diferencial e Novas Perspectivas de Tratamento tem como objetivo capacitar médicos e profissionais da saúde no diagnóstico diferenciado, cuidados e novas perspectivas de tratamento da doença celíaca. Orientação sobre aplicação da dieta com restrição ao glúten em ambiente familiar e os cuidados com a contaminação cruzada nos alimentos para evitar complicações decorrentes da má absorção de nutrientes.
Texto aprovado pela coordenadora do Multiplica PP – dra. Giovana Camargo.
Referências bibliográficas:
Doença Celíaca em Crianças e Adolescentes: Apresentação clínica e mudanças ao longo do tempo – Ana Paula Pereira de Oliveira – Universidade Federal de Minas Gerais – Belo Horizonte – 2015 – https://repositorio.ufmg.br/bitstream/1843/BUBD-A8SMC4/1/monografia_final.pdf
https://www.cuf.pt/mais-saude/doenca-celiaca-nas-criancas
https://www.scp.org.br/doenca-celiaca-3/
https://www.sbp.com.br/especiais/pediatria-para-familias/noticias/nid/doenca-celiaca/
Doença celíaca: características clínicas e métodos diagnósticos – Silvio da Rocha Carvalho, Josiane Santos de Lima Pereira, Antonio Celso Calado, Josther Gracia, José César da Fonseca Junqueira, Sheila Nogueira Rodrigues Guerra, Marcia Angelica Bonilha Valladares, Mônica Maria Cardoso Monnerat – Revista de Pediatria SOPERJ 9 – Novembro 2008 (ISSN 1676-1014 | e-ISSN 2595-1769). http://revistadepediatriasoperj.org.br/detalhe_artigo.asp?id=115